quinta-feira, 1 de setembro de 2011

A árvore sagrada !!!



Bilimbi

Nome popular: bilimbim; biri-biri; limão-de-caiena; azedinha

Nome científico: Averrhoa bilimbi L.

Família botânica: Oxalidaceae.

Características da planta: Árvore de até 15 m de altura, tronco com casca lisa e escura. Folhas formadas por muitos folíolos, pilosos. Flores pequenas, vermelho-claras, aromáticas, presas aos ramos e tronco.

Fruto: Alongado, levemente sulcado, superfície lisa de coloração verde-amarelada. Polpa amarelo-clara envolvendo 2 sementes, elípticas e brancas. Frutifica de setembro a novembro.

Cultivo: indicada para regiões tropicais

Origem e dispersão: o bilimbizeiro é originário do Sudeste Asiático e foi provavelmente introduzido no Brasil pela região Amazônica através de Caiena, de onde vem o nome limão-de-caiena.

O bilimbi é uma fruta muito próxima da carambola. Pouco menor do que esta e um pouco mais esverdeado, o bilimbi difere da outra basicamente por seu formato mais alongado e por apresentar o conhecido aspecto de estrela menos definido. Sua polpa firme e seu suco abundante contem, também como a carambola, altos teores de vitamina C e de ácido oxálico.

Verde ou maduro, ao contrário da carambola, o bilimbi é, quase sempre, considerado muito ácido e amargo para ser comido cru. Processado, salgado ou doce, o bilimbi tem os mesmos usos que a carambola: quando verde, serve para a confecção de conservas em pickles; quando maduro, aplica-se muito bem em receitas de geléias e compotas. Na culinária oriental o bilimbi é, também, bastante empregado como ingredientes no preparo de variados pratos salgados.

Segundo Pio Corrêa, o bilimbi nunca foi encontrado em estado silvestre sendo sua pátria, portanto, desconhecida como a da caramboleira. Supõe-se que ele deva ser originário do sudeste asiático, das ilhas da região da Malásia, onde até hoje é bastante produzida e comercializado.

Esse nome - bilimbi - é, aliás, uma simplificação da nome dado à fruta naquela região - blimbling asem que, por sua vez, é também semelhante ao nome dado à carambola por ali - bimbling manis - onde asem significa amargo, e manis, doce. Em inglês, o bilimbi é conhecido como cucumber tree fluit - significando, literalmente, a fruta da árvore do pepino - talvez uma referência ao fato de seu sabor e de sua aparência lembrarem os de um pequeno pepino.

Na Amazônia, onde se aclimatou muito bem, a bilimbi teria sido introduzido via Caiena, região das Guianas de onde viria o nome limão-de-caiena pela qual também é conhecido.

Clima e Solo: semelhante à caramboleira, é uma árvore relativamente adaptável a diversas condições climáticas, preferindo áreas com temperaturas médias de 25ºC, sem geadas, e precipitação pluviométrica acima de 1000 mm, bem distribuída.

Propagação: a propagação pode ser feita por sementes ou por enxertia, levando 5 a 6 anos para produzir no primeiro caso.

Variedades: há variedades que produzem frutos com menor acidez, os quais podem ser consumidos crus.

CAIPIRINHA DE BIRIBIRI


Utilização: o fruto é considerado muito ácido para consumo ao natural. Geralmente é processado salgado ou doce para confecção de conservas em picles, condimentos, molhos e preservativos. Quando maduro é utilizado em geléias e compotas. Constitui boa fonte de vitamina C.

Informações mais completas podem ser encontradas no Livro Frutas Exóticas (Funep, FCAV/Unesp)
Fonte: Livro de Frutas Exóticas

Para aqueles que quiserem uma compota, picles ou até mesmo o fruto in natura, aceito encomendas; email: virginia.carmem!gmail.com

até a próxima

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Candomblé Um rito sustentável


Candomblé
O que é o candomblé, como se prepara a festa, quem são os orixás, como funciona um terreiro, os rituais de iniciação, a sabedoria dos búzios e sua origem e misturas.

Os navios negreiros que chegaram entre os séculos XVI e XIX traziam mais do que africanos para trabalhar como escravos no Brasil Colônia. Em seus porões, viajava também uma religião estranha aos portugueses. Considerada feitiçaria pelos colonizadores, ela se transformou, pouco mais de um século depois da abolição da escravatura, numa das religiões mais populares do país.

Sílvia Campolim



Quem gosta de cachaça é Exu. Quem veste branco é Oxalá. Quem recebe oferendas em alguidares (vasos de cerâmica) são orixás. E quem adora os orixás são milhões de brasileiros. O candomblé, com seus batuques e danças, é uma festa. Com suas divindades geniosas, é a religião afro-brasileira mais influente do país.

Não existem estatísticas que dêem o número exato de fiéis. Os dados variam. Segundo o Suplemento sobre Participação Político-Social da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1988, 0,6% dos chefes de família (ou cônjuges) seguiam cultos afrobrasileiros. Um levantamento do Instituto Gallup de Opinião Pública, no mesmo ano, indicou que candomblé ou umbanda era a religião de 1,5% da população.

São índices ridículos se comparados à multidão que lota as praias na passagem de ano, para homenagear Iemanjá, a orixá (deusa) dos mares e oceanos. Elisa Callaux, gerente de pesquisa do IBGE, explica por que, tradicionalmente, os índices dos institutos não refletem exatamente a realidade: Os próprios fiéis evitam assumir, por medo do preconceito. Ela tem razão. A mais célebre mãe-de-santo do Brasil, Menininha do Gantois, falecida em 1986, declarou certa vez ao pesquisador do IBGE que era católica. Apostólica romana.

De seu lado, a Federação Nacional de Tradição e Cultura Afro-Brasileira (Fenatrab) desafia ostensivamente as cifras oficiais e garante haver 70 milhões de brasileiros, direta ou indiretamente, ligados aos terreiros seja como praticantes assíduos, seja como clientes, que ocasionalmente pedem uma bênção ou um serviço ao mundo sobrenatural.

Você pode achar um exagero, e talvez seja mesmo, mas terreiro é o que não falta. Em 1980, num convênio da Prefeitura de Salvador com a Fundação Pró-Memória, o antropólogo Ordep Serra, da Universidade Federal da Bahia, concluiu um mapeamento dos terreiros existentes na região metropolitana de Salvador. Eram 1 200. Hoje são muitos mais, assegura Serra.

Mais recentemente, o Instituto de Estudos da Religião (ISER) verificou que 81 novos centros espíritas (englobando cultos afro-brasileiros e kardecismo) haviam sido abertos no Grande Rio de Janeiro no ano de 1991, e que, em 1992, surgiram outros 83. O sociólogo Reginaldo Prandi, da Universidade de São Paulo, contou, em 1984, 19 500 terreiros registrados nos cartórios da capital paulista.

Onde tem terreiro, tem festa!
Agora, você conhecerá em detalhes um dos fenômenos mais impressionantes da civilização brasileira.



O barracão está pronto: a festa vai começar



São nove horas da noite. Os tocadores de atabaque, chamados alabês, estão a postos em seus lugares. O público cerca de 40 pessoas aguarda em silêncio, acomodado em bancos rústicos de madeira. Os homens, na fileira à direita da porta. As mulheres, do lado esquerdo. Separados, para evitar um eventual namoro. Afinal, ali não é lugar para isso. Estamos num templo do candomblé, a Casa Branca, em Salvador, Bahia, o pioneiro do Brasil, fundado em 1830.A festa (que pode ser comparada a uma missa católica) vai homenagear Xangô, o deus do fogo e do trovão.

O barracão foi decorado durante toda a tarde. O teto de telha-vã foi escondido por bandeirolas brancas e vermelhas as cores de Xangô. As paredes estão enfeitadas de flores e folhas de palmeira de dendê desfiadas. Vai começar o toque, como é chamada a festa de candomblé no Brasil. Ela é aberta a todos os orixás (deuses, que também podem ser chamados de santos) que quiserem homenagear Xangô.

O que o público vai assistir é parte de um ritual que começou horas antes. Na madrugada, os filhos-de-santo fizeram o sacrifício para o orixá homenageado. Nas primeiras horas da manhã, as filhas-de-santo prepararam a comida. Durante a tarde, foi feita a oferenda aos deuses, e Exu, o mensageiro entre os homens e os orixás, foi despachado. Entenda melhor essa preparação



O calendário litúrgico



Muitas festas não têm dia certo para acontecer.

As festas normalmente estão

associadas aos dias santos do catolicismo. Mas as datas podem variar de terreiro para terreiro, de acordo com a disponibilidade e as possibilidades da comunidade.


De maneira geral, o que importa é comemorar o orixá na sua época.

As principais festas, ao longo do ano, são as seguintes:


Abril: Feijoada de Ogum e

festa de Oxóssi (associado a

São Sebastião), em qualquer dia.

Junho: Fogueiras de Xangô

(associados a São João e

São Pedro), dias 25 e 29.

Agosto: Festa para Obaluaiê

(associado a São Lázaro e São Roque) e festa de Oxumaré (associado a

São Bartolomeu), em qualquer dia.

Setembro: Começa um ciclo de festas chamado Águas de Oxalá, que pode seguir até dezembro. Festa de Erê, em homenagem aos espíritos infantis

(associados a São Cosme e Damião). Festa das iabás (esposas de orixás)

e festa de Xangô (associado a São Jerônimo), em qualquer dia.

Dezembro: Festas das iabás Iansã (Santa Bárbara), dia 4, Oxum e Iemanjá (associadas a Nossa Senhora da Conceição), dia 8. Iemanjá também é homenageada na passagem de ano.

Janeiro: Festa de Oxalá (coincide com a festa do Bonfim, em Salvador), no segundo domingo depois do dia de Reis, 6 de janeiro.

Quaresma: O encerramento do ano litúrgico acontece durante os quarenta dias que antecedem a Páscoa, com o Lorogun, em homenagem a Oxalá.



Ao som dos atabaques, o santo baixa


Fotografar uma festa de candomblé não é tão fácil. Na Casa Branca, é absolutamente proibido. Mas outros terreiros, como o Ilê Axé Ajagonã Obá-Olá Fadaká, em Cotia, região da grande São Paulo, são mais liberais. Nesta casa, podemos bater fotos da cerimônia em homenagem a Xangô. Mas com uma ressalva: a de jamais fotografar de frente um filho-de-santo com o orixá incorporado.

A casa está cheia: 85 pessoas lotam o barracão. Os atabaques começam a falar com os deuses. Os orixás são invocados com cantigas próprias e os filhos-de-santo entram na roda, um a um, na chamada ordem do xirê: primeiro, o filho de Ogum, seguido pelos filhos de Oxóssi, Obaluaiê e assim por diante.

Ao som do canto e da batida dos atabaques, cada integrante da roda entra em transe. O corpo estremece em convulsão, às vezes suavemente, outras vezes com violência. Agora, os filhos incorporam os orixás e dançam até que o pai-de-santo autorize, com um aceno, sua saída, para serem arrumados pelas camareiras, chamadas equedes. Logo depois, eles voltam ao barracão, vestindo roupas, colares e enfeites típicos de seu santo. Ao ouvir seu cântico, cada um começa a dançar sozinho uma coreografia que conta a origem do orixá incorporado.

É quase meia-noite quando os atabaques tocam as cantigas de Oxalá, o criador dos homens. Saudado Oxalá, é hora da comunhão com os deuses: os pratos são servidos aos participantes da festa. O xirê chega ao fim.


Sem música, não existe cerimônia

Tudo acontece sob a batida de três atabaques

Os três atabaques que fazem soar o toque durante o ritual também são responsáveis pela convocação dos deuses.

O rum funciona como solista, marcando os passos da dança. Os outros dois, o rumpi e o lé, reforçam a marcação, reproduzindo as modulações da língua africana iorubá uma língua cantada, como o sotaque baiano. Além dos atabaques, usam-se também o agogô e o xequerê.

São, ao todo, mais de quinze ritmos diferentes. Cada casa-de-santo tem até 500 cânticos. Segundo a fé dos praticantes, os versos e as frases rítmicas, repetidos incansavelmente, têm o poder de captar o mundo sobrenatural. Essa música sagrada só sai dos terreiros na época do carnaval, levada por grupos e blocos de rua, principalmente em Salvador, como Olodum ou Filhos de Gandhi .



As divindades têm defeitos humanos


Em qualquer terreiro, a entrada dos orixás na festa segue sempre a mesma seqüência da ordem do xirê. Depois de despachar Exu, o primeiro a entrar na roda é Ogum, seguido de Oxóssi, Oba- luaiê, Ossaim, Oxumaré, Xangô, Oxum, Iansã, Nanã, Iemanjá e Oxalá.

Segundo a tradição, os deuses do candomblé têm origem nos ancestrais dos clãs africanos, divinizados há mais de 5 000 anos. Acredita-se que tenham sido homens e mulheres capazes de manipular as forças da natureza, ou que trouxeram para o grupo os conhecimentos básicos para a sobrevivência, como a caça, o plantio, o uso de ervas na cura de doenças e a fabricação de ferramentas.

Os orixás estão longe de se parecer com os santos cristãos. Ao contrário, as divindades do candomblé têm características muito humanas: são vaidosos, temperamentais, briguentos, fortes, maternais ou ciumentos. Enfim, têm personalidade própria. Cada traço da personalidade é asso-ciado a um elemento da natureza e da sua cultura: o fogo, o ar, a água, a terra, as florestas e os instrumentos de ferro.

Na África Ocidental, existem mais de 200 orixás. Mas, na vinda dos escravos para o Brasil, grande parte dessa tradição se perdeu. Hoje, o número de orixás conhecidos no país está reduzido a dezesseis. E, mesmo desse pequeno grupo, apenas doze são ainda cultuados: os outros quatro Obá, Logunedé, Ewa e Irôco raramente se manifestam nas festas e rituais.


Deuses e homens sob o mesmo teto


O terreiro, ou casa-de-santo, é simultaneamente templo e morada. A vida cotidiana dos mortais mistura-se com os rituais dos orixás. A família-de-santo (a mãe ou o pai e os filhos-de-santo, não necessariamente parentes de sangue) divide os cômodos com os deuses.

A divisão do espaço, na Casa Branca, em Salvador, lembra os compounds africanos, ou egbes antigas habitações coletivas dos clãs, usadas principalmente pelos povos de língua iorubá. O cômodo principal é o barracão, o salão onde humanos e santos se encontram nas festas.

Por trás do barracão, há várias instalações comuns a uma residência: salas de jantar e de estar, cozinha e quartos nem todos destinados aos mortais. Há os quartos-de-santo, onde ficam os pejis (altares) e os assentamentos (objetos e símbolos) dos orixás. Aí são feitas as oferendas. Na Casa Branca, os dois únicos orixás que têm quartos dentro da casa são Xangô e Oxalá.

O roncó é um quarto especial onde os abiãs (noviços) ficam recolhidos durante o processo de iniciação. Essa proximidade dos abiãs com os outros membros do terreiro é fundamental: é assim que os iniciados entram em contato com os procedimentos rituais da casa. O fiel do candomblé aprende com os olhos e os ouvidos. Ele deve prestar atenção a tudo e não perguntar nada.

Os terreiros têm também uma área externa, onde estão as casas dos outros orixás. A de Exu, por exemplo, fica perto da porta de entrada.



Sucessão: guerra à vista

A sucessão numa casa-de-santo é sempre tumultuada: basta o pai-de-santo morrer para ter início uma verdadeira guerra entre orixás. Os filhos que não concordam com a indicação dos búzios costumam abandonar o terreiro e fundar sua própria casa. Foi assim que nasceu, no início do século, o Gantois uma das casas mais conhecidas em Salvador. A partir da década de 70, mãe Menininha do Gantois se tornou conhecida no Brasil inteiro, cantada por compositores, como Dorival Caymmi e Caetano Veloso, e venerada por intelectuais, como Jorge Amado. Mãe Menininha morreu aos 92 anos de idade, em 1986. Deixou em seu lugar mãe Creusa.



Por meses, o noviço só come com as mãos

Os filhos-de-santo são os sacerdotes dos orixás, da mesma forma como, na Igreja Católica, os padres são os representantes de Deus. Nem todos, porém, são preparados para receber os santos. Existem os que cuidam dos filhos-de-santo quando os orixás baixam, os que sacrificam os animais, os que tocam os atabaques e os que preparam a comida. Os búzios, usados como instrumento de adivinhação, é que vão dizer qual a função de cada um.

A entrada para essa hierarquia é a indicação do orixá. É o que se chama bolar no santo. A partir daí, o abiã (noviço) tem de se submeter aos rituais de iniciação cerimônias do bori, orô e saídas de iaô.

Um recém-iniciado passa de um a seis meses vivendo dentro de severas restrições. É o tempo de quelê o período em que o abiã usa um colar de contas justo ao pescoço. Enquanto usar o quelê, ele deve vestir branco, comer com as mãos e sentar-se só no chão. Estão proibidas as relações sexuais e os pratos que não sejam os de seu orixá.

Nem todos os terreiros seguem à risca todas as imposições. Mas pelo menos algumas têm de ser obedecidas: é parte do compromisso do abiã com seu orixá e seu pai ou mãe-de-santo. As obrigações não terminam por aí: o iniciado, que agora se chama iaô, terá de cumprir ainda três rituais depois de um ano, três anos e sete anos , com sacrifícios, toques e oferendas. Só depois ele pode se candidatar a ebômi, o degrau seguinte da hierarquia.





A sabedoria da morte e da advinhação

Como toda religião , o candomblé tem sua maneira própria de encarar a morte. Segundo a crença, a alma vive no Orum, que corresponde, mais ou menos, ao céu dos católicos. Ela é imortal e faz várias passagens do Orum para a vida terrena. Cada um tem controle sobre essas viagens: quem tem uma boa experiência em vida, pode escolher um destino melhor, na vinda seguinte.

Aqui na Terra, nada que se refira aos deuses e ao futuro pode ser dito sem a consulta ao Ifá, ou seja o jogo de búzios, conchas usadas como oráculo. O Ifá revela o orixá de cada um e orienta na solução de problemas.

O jogo usa dois caminhos: a aritmética e a intuição. Pela aritmética, é contado o número de conchas, abertas ou fechadas, combinadas duas a duas. Para interpretar todas as combinações possíveis dos bú- zios, o pai-de-santo conhece de cor 256 lendas que traduzem as mensagens dos deuses. Isso não é nada raro no candomblé, onde nada é escrito. Toda a sabedoria é transmitida oralmente.

No outro sistema de adivinhação, o intuitivo, o pai-de-santo estuda a posição dos búzios em relação a outros elementos na mesa, como uma moeda ou um copo d'água. Se o búzio cai perto da moeda, por exemplo, pode indicar que não há problemas com dinheiro. Mas é preciso estar preparado: os orixás vão cobrar pela consulta uma obrigação. Mãe Kutu, que foi formada pela Casa Branca e está montando seu próprio terreiro, diz: Se não vai fazer a obrigação, é melhor nem perguntar aos búzios.



Reza para o santo católico e vela para o orixá


Existem diferentes tipos de candomblé no Brasil, cada um deles saído de uma nação. A palavra nação aqui não tem nada a ver com o conceito político e geográfico, mas com os grupos étnicos daqueles que foram trazidos da África como escravos. As diferenças aparecem principalmente na maneira de tocar os atabaques, na língua do culto e no nome dos orixás.

Os povos que mais influenciaram os quatro tipos de candomblé praticados no Brasil são os da língua iorubá. Os rituais da Casa Branca, em Salvador, e da casa de Cotia, em São Paulo, descritos nesta reportagem, pertencem ao tipo Queto.

A mistura com o catolicismo foi uma questão de sobrevivência. Para os colonizadores portugueses, as danças e os ri- tuais africanos eram pura feitiçaria e deviam ser reprimidos. A saída, para os escravos, era rezar para um santo e acender a vela para um orixá. Foi assim que os santos católicos pegaram carona com os deuses africanos e passaram a ser associados a eles. A partir da década de 20, o espiritismo também entrou nos terreiros, criando a umbanda, com características bem diferentes.

Assim, o candomblé já se incorporou à alma brasileira. Tanto é que o país inteiro conhece o grito de felicidade a sau-dação mágica que significa, em iorubá, energia vital e sagrada: Axé!



Da África ao Brasil, uma boa mistura:


A principal diferença entre os vários tipos de candomblé é a origem étnica.


Há muitas nações dentro do candomblé:

o keto, da Bahia, o Xangô, de Pernambuco, o Batuque, do Rio Grande do Sul, e o Angola, da Bahia e São Paulo, e o geges que hoje podemos encontrar fortemente no nordeste, e por que não falar no Maranhão com a particularidade do tambor de mina com o culto aos egúns. O keto chegou com os povos nagôs, que falam a língua iorubá (em

vermelho, no mapa). Saídos das regiões que hoje correspondem ao Sudão, Nigéria e Benin, eles vieram para o Nordeste. Os bantos saíram das regiões de Moçambique, Angola e Congo para Minas Gerais, Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo (em amarelo, no mapa). Criaram o culto ao caboclo, representante das entidades da mata.






Candomblé não é umbanda, As duas são religiões afro-brasileiras.

Umbanda é a mistura do candomblé com espiritismo



Candomblé


Deuses: Orixás de origem africana. Nenhum santo é superior ou inferior a outro. Não existe o Bem e o Mal, isoladamente.



Culto: Louvação aos orixás que incorporam nos fiéis, para

fortalecer o axé (energia vital) que protege o terreiro e seus membros.


Iniciação: Condição essencial para participar do culto. O recolhimento dura de sete a 21 dias. O ritual envolve o sacrifício de animais,

a oferenda de alimentos e a obediência a rígidos preceitos.

Música: Cânticos em língua africana, acompanhados por

três atabaques tocados por iniciados do sexo masculino.


Umbanda


Deuses: As entidades são agrupadas em hierarquia, que vai dos espíritos mais baixos aos mais evoluídos.


Culto: Desenvolvimento espiritual dos médiuns que, quando incorporam, dão passes e consultas.


Iniciação: Não é necessária.

O recolhimento é de apenas um ou dois dias. O sacrifício de animais não é obrigatório.

O batismo é feito com água do mar ou de cachoeira.

Música: Cânticos em português, acompanhados por palmas e atabaques, tocados por fiéis de qualquer sexo.


Quem é quem (e quem faz o quê) na hierarquia de uma casa-de-santo


Cada iniciado tem uma função dentro do terreiro. Nem todos recebem santo.



Abiã

Noviço, primeiro degrau da hierarquia. Após iniciado, será filho-de-santo.


Iaô

Filho-de-santo, segundo degrau na hierarquia. Podem ou não receber santo.


Ebômi

Terceiro degrau. Iaô que cumpriu as obrigações de sete anos. Recebe santo.



Iabassê

Quarto degrau, Não recebe santo. É a responsável pela cozinha do terreiro.



Agibonã

Mãe criadeira. Também quarto degrau. Cuida dos iaôs durante o ritual de iniciação. Não recebe santo.



Ialaxé

Quinto degrau. Zela pelas oferendas e objetos de culto aos orixás. Não recebe santo.



Baba-quequerê e Iaquequerê

Sexto degrau. Pai ou mãe-pequena. Recebe. Ajuda o pai ou mãe-de-santo no comando do terreiro.



Baba-lorixá e Ialorixá

Pai ou mãe-de-santo, chefe do terreiro, último degrau da hierarquia. Recebe santo e joga búzios.


Ajudantes sagrados

Pais e mães terrenos dos orixás ficam fora da hierarquia.

Ogã

Filho-de-santo que não recebe. O Ogã pode ser Axogum ou Alabê, conforme sua tarefa.



Axogum

Ogã responsável pelo sacrifício de animais a serem ofertados aos orixás. Não recebe santo.



Alabê

Ogã tocador dos atabaques e instrumentos rituais. Não recebe santo.



Equede

Paralela ao Ogã, Não recebe. Cuida dos orixás incorporados e de seus objetos.


As diversas fases da iniciação

Primeiro, o santo indica a pessoa a ser iniciada. Depois, é preciso cumprir outros três passos:


Bolar no santo

É o mesmo que cair no santo. Este é o sinal que indica a necessidade de iniciação de uma pessoa no candomblé. Acontece sem previsão, normalmente numa festa: durante a dança e os cânticos o orixá se manifesta no futurofilho-de-santo, que é agitado por tremores e sobressaltos violentos. Quem já bolou conta que sentiu arrepios, calor, fraqueza e sensação de desmaio. Quando acorda no roncó (o quarto do terreiro reservado à pessoa que bolou), o abiã não consegue se lembrar de nada do que aconteceu.



O bori

É a cerimônia que reforça a ligação entre o orixá e o iniciado. O abiã se senta numa esteira, rodeado de alimentos secos, aves, velas e objetos de seu orixá. Ajudado pelos filhos já feitos, o pai ou a mãe-de-santo sacrifica aves. O sangue é usado para marcar o corpo do noviço e para banhar as oferendas ao orixá.

A cerimônia só termina quando as aves são servidas aos membros da família-de-santo. Depois do bori, o futuro filho-de-santo passa a assistir às cerimônias e a preparar o enxoval (a roupa e os adereços de seu orixá) para terminar a iniciação, com as saídas de iaô.



Orô

Confinado ao quarto de recolhimento (roncó), por 21 dias, o noviço conhece a hierarquia da casa, os preceitos, as orações, os cânticos, a dança de seu orixá, os mitos e suas obrigações. Durante esse tempo ele toma infusões de ervas, que o deixam num estado de entorpecimento e abrem espaço na sua mente para o orixá. A cabeça é raspada e o crânio marcado com navalha: é por esses cortes que o orixá vai entrar, quando for incorporado. No final, o iniciado é batizado com sangue de um animal quadrúpede, sacrificado.

Os iaôs são apresentados à comunidade, como num baile de debutante

Na primeira saída, os iaôs vestem branco em homenagem a Oxalá, pai de todos. Saúdam o pai-de-santo, os atabaques e os pontos principais do barracão e vão-se embora. Na segunda saída, os iaôs voltam com roupas coloridas e a cabeça pintada, segundo seus orixás. Dançam e deixam o barracão, em seguida.

Na terceira saída, os orixás anunciam oficialmente seus nomes. Os iaôs entram em transe e se retiram para vestir as roupas do santo incorporado.








Os doze orixás mais cultuados no Brasil



Cada um deles tem o seu símbolo, o seu dia da semana, suas vestimentas e cores próprias. Como os homens, são temperamentais




Exu

Orixá mensageiro entre os homens e os deuses, guardião da porta da rua e das encruzilhadas. Só através dele é possível invocar os orixás.

Elemento: fogo

Personalidade: atrevido e agressivo

Símbolo: ogó (um bastão adornado com cabaças e búzios)

Dia da semana: segunda-feira

Colar: vermelho e preto

Roupa: vermelha e preta

Sacrifício: bode e galo preto

Oferendas: farofa com dendê, feijão, inhame, água,mel e aguardente




Ogum

Deus da guerra, do fogo e da tecnologia. No Brasil é conhecido como deus guerreiro. Sabe trabalhar com metal e, sem sua proteção, o trabalho não pode ser proveitoso.

Elemento: ferro

Símbolo: espada

Personalidade: impaciente e obstinado

Dia da semana: terça-feira

Colar: azul-marinho

Roupa: azul, verde escuro, vermelho ou amarelo

Sacrifício: galo e bode avermelhados

Oferendas: feijoada, xinxim, inhame




Oxóssi

Deus da caça, É o grande patrono do candomblé brasileiro.

Elemento: florestas

Personalidade: intuitivo e emotivo

Símbolo: rabo de cavalo e chifre de boi

Dia da semana: quinta-feira

Colar: azul claro

Roupa: azul ou verde claro

Sacrifício: galo e bode avermelhados e porco

Oferendas: milho branco e amarelo, peixe de escamas, arroz, feijão e abóbora




Obaluaiê

Deus das doenças da pele e, É o médico dos pobres.

Elemento: terra

Personalidade: tímido e vingativo

Símbolo: xaxará (feixe de palha e búzios)

Dia da semana: segunda-feira

Colar: preto e vermelho, ou vermelho, branco e preto

Roupa: vermelha e preta, coberta por palha

Sacrifício: galo, pato,bode e porco

Oferendas: pipoca, feijão preto, farofa e milho, com muito dendê




Oxum

Deusa das águas doces (rios, fontes e lagos). É também deusa do ouro, da fecundidade, do jogo de búzios e do amor.

Elemento: água

Personalidade: maternal e tranqüila

Símbolo: abebê (leque espelhado)

Dia da semana: sábado

Colar: amarelo ouro

Roupa: amarelo ouro

Sacrifício: cabra, galinha, pomba

Oferendas: milho branco, xinxim de galinha, ovos, peixes de água doce




Iansã

Deusa dos ventos e das tempestades.

É a senhora dos raios e dona da alma dos mortos.

Elemento: fogo

Personalidade: impulsiva e imprevisível

Símbolo: espada e rabo de cavalo (representando a realeza)

Dia da semana: quarta-feira

Colar: vermelho ou marrom escuro

Roupa: vermelha

Sacrifício: cabra e galinha

Oferendas: milho branco, arroz, feijão e acarajé




Ossaim

Deus das folhas e ervas medicinais. Conhece seus usos e as palavras mágicas (ofós) que despertam seus poderes.

Elemento: matas

Personalidade: instável e emotivo

Símbolo: lança com pássaros na forma de leque e feixe de folhas

Dia da semana: quinta-feira

Colar: branco rajado de verde

Roupa: branco e verde claro

Sacrifício: galo e carneiro

Oferendas: feijão, arroz, milho vermelho e farofa de dendê




Nanã

Deusa da lama e do fundo dos rios, associada à fertilidade, à doença e à morte. É a orixá mais velha de todos e, por isso, muito respeitada.

Elemento: terra

Personalidade: vingativa e mascarada

Símbolo: ibiri (cetro de palha e búzios)

Dia da semana: sábado

Colar: branco, azul e vermelho

Roupa: branca e azul

Sacrifício: cabra e galinha

Oferendas: milho branco, arroz, feijão, mel e dendê




Oxumaré

Deus da chuva e do arco-íris. É, ao mesmo tempo, de natureza masculina e feminina. Transporta a água entre o céu e a terra.

Elemento: água

Personalidade: sensível e tranqüilo

Símbolo: cobra de metal

Dia da semana: quinta-feira

Colar: amarelo e verde

Roupa: azul claro e verde claro

Sacrifício: bode, galo e tatu

Oferendas: milho branco, acarajé, coco, mel, inhame e feijão com ovos





Iemanjá

Considerada deusa dos mares e oceanos. É a mãe de todos os orixás e representada com seios volumosos, simbolizando a maternidade e a fecundidade.

Elemento: água

Personalidade: maternal e tranqüila

Símbolo: leque e espada

Dia da semana: sábado

Colar: transparente, verde ou azul claro

Roupa: branco e azul

Sacrifício: porco, cabra e galinha

Oferendas: peixes do mar, arroz, milho, camarão com coco




Xangô

Deus do fogo e do trovão. Diz a tradição que foi rei de Oyó, cidade da Nigéria. É viril, violento e justiceiro. Castiga os mentirosos e protege advogados e juízes.

Elemento: fogo

Personalidade: atrevido e prepotente

Símbolo: machado

duplo (oxé)

Dia da semana: quarta-feira

Colar: branco e vermelho

Roupa: branca e vermelha, com coroa de latão

Sacrifício: galo, pato, carneiro e cágado

Oferendas: amalá (quiabo com camarão seco e dendê)




Oxalá

Deus da criação. É o orixá que criou os homens. Obstinado e independente, é representado de duas maneiras: Oxaguiã, jovem, e Oxalufã, velho.

Elemento: ar

Personalidade: equilibrado e tolerante

Símbolo: oparoxó (cajado de alumínio com adornos)

Dia da semana: sexta-feira

Colar: branco

Roupa: branca

Sacrifício: cabra, galinha, pomba, pata e caracol

Oferendas: arroz, milho branco e massa de inhame



O toque

É o mesmo que festa e se refere à batida dos atabaques, que convoca os orixás. A estrutura da cerimônia, chamada ordem do xirê (brincadeira, na língua iorubá), divide a festa em três partes. A primeira acontece à tarde, com o sacrifício, a oferenda e o padê de Exu. A segunda é a festa em si, à noite, na presença do público, quando os filhos-de-santo incorporam os orixás. E a terceira fase, o encerramento, com a roda de Oxalá, o deus criador do homem.



O sacrifício

Acontece apenas diante dos membros da comunidade de santo e envolve no mínimo dois animais: um, de duas patas, para Exu, e outro, de quatro patas, macho ou fêmea, dependendo do sexo do orixá a ser homenageado. Quem realiza o sacrifício é o ogã axogum, um iniciado no candomblé

especialmente preparado para isso. Os bichos são mortos com um golpe na nuca. Depois, a cabeça e os membros são cortados fora e o animal sacrificado vai sangrar até a última gota antes de ser destinado à oferenda.



A oferenda

Depois do sacrifício, a moela, o fígado, o coração, os pés, as asas e a cabeça são separados e oferecidos ao orixá homenageado num vaso de barro, chamado alguidar. O sangue, recolhido numa quartinha de cerâmica (espécie de moringa), é derramado sobre o assentamento do santo, ou seja, o local onde ficam seus objetos e símbolos. As partes restantes são destinadas ao jantar oferecido aos orixás, ainda à tarde, e aos participantes, ao final da festa pública, à noite.



O padê de Exu

Este é também um ritual fechado ao público. Significa despacho de Exu. É ele quem faz a ponte entre o mundo natural e o sobrenatural. Portanto, é ele quem convoca os orixás para a festa dos humanos. Para isso, é preciso agradá-lo, oferecendo comida (farofa com dendê, feijão ou inhame) e bebida (água, cachaça ou mel). As oferendas são levadas para fora do barracão e a porta de entrada é batizada com a bebida, já que Exu é o guardião da entrada e das encruzilhadas (por isso é comum ver oferendas em esquinas nas ruas e em encruzilhadas nas estradas).



Parte desse texto foi extraido da edição 99 da revista Super.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Contos de domingo




Comidinha de domingo da vó Edna, saborosa, acarinhada, aquele feijão verde, talharim com queijo ralado Pampulha, batatas cortadas grosseiramente douradas em misto de manteiga e óleo, farofa bolão (farinha de mandioca num prato uma covinha no meio para abrigar uma colher de manteiga da boa “aviação”, um pouco de cebola, sal e coentro bem picadinho na mão, água fervente para não escaldar a farinha) ela é umedecida em molho espesso de galinha de cabidela morta com aquela faca peixeira de mil novecentos e tarará.
Bom mesmo antes de comer os bolos feitos das suas mãos e entregues a escadinha de netos que se formava para comer essa delícia, era a farra da morte da galinha, a coitadinha da galinha comprada pela manhã bem cedinho na granja, que por volta das oito da manhã quase quatro litros de agua já fervia em uma panela grande, quando vovó pega a galinha pelas asas a prende pelos pés, e seu pescoço era despenado e dado leves batidas com o cabo da faca para facilitar o sangue escorrer, no chão um prato com vinagre, e um garfo para minha tia Jane bater o sangue que fosse saindo do pescoço da galinha, e eu ao ver toda aquela cena da degola da galinha me acabando de pena, sentimento que depois deu vez a pavor em ver a penada correr pelo quintal degolada e depois de muito correr ela cambalear e finalmente cair durinha e morta na minha frente.
Sem contar nos empurrões que eu levava da tia depois do ocorrido, nos domingos que se seguiram sempre teimava em participar da morte da galinha e era posta pra fora do quintal aos gritos por vovó ai que saudade disso tudo.


Hoje os domingos da minha vó continuam quase os mesmos, com exceção da morte da galinha. Minha querida vó você é linda, como é linda tudo que você faz, poder ter sido criada por você, ter aprendido segredos de panela de experiências únicas nas cozinhas das escolas, comidas de Quintana e quintais, de senzalas e casarões, orgulho-me hoje ter finalmente a profissão que junto comigo sonhaste tanto, a de cozinheira de forno a fogão.
Hoje eu escrevo, cozinho sonho, ofereço e tenho de volta tudo àquilo que eu pedir aos meus orixás; essas experiências são para mim como ganhar um beijo de minha mãe, gostoso, amoroso, suave, sal e açúcar no ponto certo, porque a mesma mão que bate, acarinha, a boca que morde ao mesmo tempo assopra, atos esses me fizeram ser a mulher que sou hoje.
Suas memórias minha querida vó, são exatamente como as minhas, que fluem docemente para o mundo da comida, são como noite de São João: tudo aceso e quente como as fogueiras que morríamos de medo de não conseguimos acende-las, acreditávamos que se não conseguíamos acender uma fogueira, no próximo são João não estaríamos aqui pra contar essas historias, eis uns dos motivos que eu preferia ralar milho e coco para a sua deliciosa canjica em vez de gastar energia atrás de madeira para a tal fogueira. Da qual só me aproximava ao sentir os estalos da madeira, e ver as brasas como estrelas no chão, devaneios no ar, coração na mão, com os sustos que tomávamos por causa dos fogos de artifícios que estourava nas ruas, sempre preferi as estrelinhas que compravas pra mim por ser menina e pra Igor tinha sempre um traque de massa. Que chatice deliciosa. Fecho os olhos e visualizo a mesa repleta de delícias, canjica, pé de moleque, manuê, feitos por tia Jane, os pratinhos destinados aos vizinhos eram pequenas delicias, carinho e consideração que se come, as, Marias, Lia, Neusa, Dora, e Lô já aguardavam no portão de casa os mimos, recomendávamos sempre o cuidado e a devolução dos utensílios usados para colocar as comidas; estes sempre voltavam com alguma outra comida, rituais esse feito para que nunca deixasse de ter comida em ambas às mesas.
Mesa posta, Viva! Hora do Ajeun, mas antes de comer é bom rezar, pra mostrar gratidão a Deus, pregar o amor fraterno, e a saúde no prazer de comer.
Somos todos abençoados filhos, netos e vizinhos de Dona Edna, acolhidos nessa mesa, nesse abraço, nesses sabores.
Iemanjá sincretizada na forma de Nossa Senhora da Conceição abençoa a alegria dessa matriarca seja no sereno de junho ou no calor de fevereiro, no estrelado céu; seja de Santo Amaro ou de Maranguape Deus é um só, seja onde for.
Todo dia é dia de comida! Dia de Edna! Dia de celebrar a vida, dia de agradecer o sopro de Orumilá em nossas vidas, Aprendi assim, todos os gostos, paladares, prazeres para toda vida. Deus nos guarde! Salve as águas que me fizeram nascer no seio dessa mulher, minha Oloxúm Edna Amara Sua bênção!

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

orixás segundo Vilson Caetano de Souza Júnior





Reproduzo neste post textos sobre os orixás Oxun, Yemanjá e Xangô, de autoria de VILSON CAETANO DE SOUSA JUNIOR, antropólogo que escreve na coluna de Religião publicada no caderno de classificados do jornal A Tarde.


OXUN


A ARTISTA DO UNIVERSO


texto de VILSON CAETANO DE SOUSA JUNIOR*


Nos primórdios, Oxalá criou os sons, mas tudo continuava ainda confuso. Oxun combinou os diferentes tons. Ela havia acabado de inventar a música.

O culto ao orixá Oxun no Brasil confunde-se com o de Yemanjá, sua mãe. De acordo com o mito, Oxun teria nascido após a imposição das mãos de todos os orixás sobre a sua mãe.

Oxun é o princípio ancestral da maternidade, conceito que nos últimos anos passou a ser contestado por algumas correntes do movimento feminista, mas que ainda goza dentre os africanos valor fundamental. Enquanto alguns ancestrais são chamados de Ye, mãe, Oxun é chamada de Yeye, mamãe. Acredita-se que no momento da divisão dos poderes, enquanto alguns ancestrais brigavam pela terra, outros pelo ferro, Oxun apressou-se e pegou eyn, o ovo. A partir desse fato ela passou a acompanhar todos os acontecimentos.

Oxun está em tudo, pois ela regula tudo que é cíclico. Ela não somente comanda o ciclo menstrual, mas também as estações e o próprio movimento dos planetas. Oxun regula as marés, cuida das crianças e preside desde a fecundação ao amadurecimento dos frutos. A esse principio ancestral são consagradas todas as frutas.

Trinta anos atrás, quando ainda “a cidade de Salvador era um pomar”, no mês de dezembro, por ocasião da festa de Nossa Senhora da Conceição, barracas eram espalhadas em torno da Igreja para celebrar as “frutas do ano”.

Oxun foi a primeira pediatra do Universo. Ela auxiliava as crianças na hora de vir ao mundo ou retornar deste. Oxun assim acompanha os ritos de iniciação no mundo dos antepassados, pois ela está à frente de todos os nascimentos.

Desde cedo se associou esse principio ancestral às águas, Oxun, de fato, é todas as águas, sobretudo o líquido que preenche a placenta.

Na verdade, este princípio comanda “todas as coisas de dentro”. Oxun garante o funcionamento do nosso organismo. Assim, seu domínio vai além do sistema gastro-intestinal. Fato este que a fez desde cedo ser associada à comida. Se diz nos terreiros que Oxun é a dona da panela.

Se a panela representa o mundo, depois de tudo que explicamos, podemos dizer que Oxun dá sentido ao mundo, por isso é atribuída a ela a invenção da linguagem.

Como a costureira, Oxun une partes diferentes e o resultado é a quebra de fronteiras, a mesma observada no mercado.

Falando sobre o mercado, antes mesmo dos anos 60, referencial do momento em que algumas mulheres foram reividicando a sua independência, as sociedades yorubás já conheciam, além de mulheres no mercado de trabalho, sem abrir mão de sua maternidade, a figura da Yalodê, literalmente a “mãe que vai a rua”, ou a mãe que está na rua.

Ainda hoje podemos encontrar a Yalodê entre os yorubás. Trata-se de uma mulher designada pelas outras mulheres para tomar assento em decisões “fora de casa”.

A Yalodê fala no conselho por todas as mulheres e acredita-se que assim foi “desde o princípio do mundo”, quando Oxun foi convidada para acompanhar os orixás caçadores por todos os cantos da terra.

Outra imagem vinculada a Oxun é o pássaro. Verdade é que todas as aves pertencem a Oxun. Oxun cuida do mundo como a galinha cuida dos pintinhos embaixo de suas asas.

As histórias sobre este principio ancestral confundem-se com as histórias sobre a própria cidade de Salvador, cidade beira mar onde se canta em coro que “todo mundo é de Oxun”.

Segundo o Babalorixá Air José, três mulheres de Oxun comandaram a cidade no século passado: Maria Bibiana, Senhora de Oxun; Maria Escolástica, Menininha do Gantois, a Oxun mais cantada pelo mundo afora; e Caetana América Sowzer, a saudosa Yá Caetana Bagbosé.

Mãe Caetana era filha de Felizberto Sowzer, conhecido como Benzinho, que era filho de Júlia Andrade, filha de Tio Bangbose.

Benzinho era filho de Ogun e foi o responsável pela organização do jogo de búzios, conhecido como merindilogun no Brasil, conforme informações de seu neto consanguíneo Air José, filho de Tertuliana Souza, irmã de Yá Caetana.

No terreiro Pilão de Prata, a festa de Oxun realizada neste domingo [7.3.2010] é uma das mais concorridas. A festa é dedicada a Oxun de Mãe Caetana. Nesta comunidade, Oxun recebe o título de Yalê, mãe da casa.

Caetana América Sowzer ainda hoje é referenciada pelas pessoas que tiveram o privilégio de conviver com ela como mestra. Seu pai teria “traduzido” um dos sistemas adivinhatórios africanos mais complexos, mas coube a ela zelar com determinação pelos princípios fundamentais para a consolidação dos elementos civilizatórios negro-africanos no Brasil através da religião dos Orixás.

Mãe Caetana era uma Apetebi – como as esposas dos Babalawo, ela começava a transmitir as histórias sagradas desde cedo às crianças que tomava para criar.

Segundo o Pai Air, Mãe Caetana exigia que alguns momentos rituais, a fim de não se perderem, fossem registrados em cadernos, hoje amarelados.

Mãe Caetana era costureira, gostava de fazer bonecas, adorava artes. Era também músico, tocava violino.

Yá Caetana fez uma brilhante caminhada, como Oxun entendeu cedo que a serenidade vence qualquer guerra e que a simpatia é capaz de transformar qualquer momento em festa e alegria.

Hoje, aquela que foi chamada de Laju omim, olhos d’água, uma nascente, fonte, continua no mundo, agora no céu, certamente compondo a mais bela constelação, brilhando como uma estrela.

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VILSON CAETANO com estatuetas de Ibeji (Cosme e Damião), em sala do Terreiro Pilão de Prata, Boca do Rio, Salvador-BA. Foto de FERNANDO AMORIM | Agência A Tarde 24.9.2009





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YEMANJÁ


A MÃE DOS ORIXÁS

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texto de VILSON CAETANO DE SOUSA JUNIOR*

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Sem sombra de dúvida, Yemanjá é o orixá mais popular no Brasil e talvez isso valha também para outros países costeiros, ou a beira mar, como Cuba, onde esta é considerada a rainha da ilha pelos santeiros.

Como outros ancestrais nagôs, o culto a tal orixá realizado na cidade de Abeokutá e no rio Ogun sofreu um processo significativo de reinterpretação simbólica no Novo Mundo.

O exemplo mais ilustrativo disso, é a perda de características guerreiras em detrimento da exacerbação de elementos como virgindade, pureza e docilidade, ideais por excelência da figura da Virgem Maria que desde cedo recebeu atributos das deusas africanas, a exemplo de Isis, de quem herdou o título de Mater Dei e de outras deusas gregas e romanas.

Diferente da ideia de humildade e submissão, características esperadas das mulheres pelos gregos como a terra que sustenta o céu, Yemanjá está no começo da criação do Mundo. Acredita-se que ela forma um par criativo com Oxalá. Isso explica a sua profunda relação com o elemento água, cheio de significados na maioria das civilizações.

Por exemplo, algumas mulheres indígenas do litoral se lavavam na praia, pois acreditavam que a espuma do mar as tornava férteis.

Yemanjá é o princípio criativo da fertilidade. Ela está na terra, nos grãos, nos rios, nos mares, em todas as mulheres e em todos os seus filhos, que coparticipam desse poder graças à força conferida pelas Grandes Mães.

As representações desse Orixá, que desde cedo foi associado às sereias, ao longo da história recebeu elementos que lhe afastam da representação africana. Em algumas dessas, para se falar da noção de beleza, se fez uso de características não negras. Desta maneira, a representação da mulher com seios volumosos e formas arredondadas cedeu lugar para a imagem de uma mulher branca, cabelos lisos e corpo magro e esguio.

Não estamos com isso contestando a capacidade de o devoto fazer a sua experiência religiosa nessas representações, mas chamando a atenção para o fato de que as imagens do sagrado vinculam visões de mundo e expressam valores da sociedade que lhe está produzindo o tempo todo. O problema está quando não nos damos conta disso.

Sobre isso, as mulheres do movimento negro iniciaram já há alguns anos uma crítica e tem se avançado muito.

E a sereia? Sempre disse que é o contrário do princípio da Grande Mãe, por tratar-se de seres que carregam a “maldição” de não poderem ter filhos, o contrário de Yemanjá, mãe dos Orixás, a menos daqueles ligados à dinastia de Oyó, como Ogun, Odé, Xangô e Oxun.

Da sereia grega, o símbolo que estabelece melhor diálogo com Yemanjá é a imagem do peixe que como o pássaro, o leque e as águas são considerados “princípios femininos” que não podem ser compreendidos em contraposição a outros.

Dessa maneira, o atributo por excelência da Grande Mãe é a guerra. Segundo um de seus mitos, ela teria ensinado Ogun a forjar as “pencas”, depois transformadas nos famosos balangandãs que, mais do que enfeites, cumprem funções de proteção; depois a espada para defender o seu reino.

Outra história conta como Yemanjá venceu alguns inimigos que marchavam em direção ao seu reino. Ela teria se enfeitado e levantado o seu leque que, em contato com o sol, multiplicou o seu exército.

Sobre a origem dos presentes oferecidos às águas, já explicamos no texto sobre as oferendas. Trata-se de uma prática antiga que pode ser encontrada em várias civilizações. A sua origem está na concepção do valor da troca de presentes com os ancestrais verdadeiros responsáveis pela manutenção das comunidades.

Nos últimos anos grupos ambientalistas têm aberto a discussão sobre o nível de poluição representado pelos presentes a base de produtos não degradáveis, como plásticos, vidros e outros. Claro que o povo de Candomblé não pode ser responsabilizado pela poluição dos mares, talvez isso valha para as indústrias e empreendimentos imobiliários que poluem as águas todos os dias a toda hora.

Temos, todavia, que estarmos atentos àquilo que oferecemos. Afinal, nossos antepassados não conheceram alguns presentes que hoje teimamos em colocar nas águas, e se tivessem conhecido, sem sombra de dúvida não colocariam, pois sabiam que o maior presente são os grãos, as flores e a nossa vida.

Nos terreiros de tradição nagô, diz-se que ela cuida de nossas cabeças e de tudo que se relaciona ao equilíbrio. Nas tradições angola-congo, este princípio é evocado com o nome de Kaia, mas há também tradições que o chamam de Aziri Tobossi, como a jeje.

Mais do que a designação, cada comunidade possui estórias próprias para falar desse ancestral da fertilidade que não pode ser encerrado na concepção da maternidade, afinal, há várias maneiras de conceber.

Vale mesmo não se afastar da ideia de que cada ser vivo que nasce é um ancestral que se faz presente através da constituição de longas famílias. Assim, Yemanjá, Kaya, Aziri Tobossi e mesmo Yara estão em tudo. Talvez no início tal princípio tenha sido associado às águas graças à importância que estas cumpriam nas civilizações responsáveis por tal representação.

O principio de fertilidade está, na verdade, em tudo. Ele garante o equilíbrio das coisas, as mantendo entrelaçadas como escamas, nos fazendo peixes filhos de uma mãe cujo filhos são peixes. Ye/ Omo/ Ejá.

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XANGÔ


AO REI DO MUNDO…

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texto de VILSON CAETANO DE SOUSA JUNIOR*

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Xangô é rei. É rei no Batuque do Rio Grande do Sul, é rei no Xambá de Pernambuco, estado onde o seu nome é evocado para designar as religiões de matriz africana, é rei nos candomblés nagôs do Recôncavo baiano, é rei no Tambor de Mina no Maranhão e é rei nos candomblés jeje nagô na cidade de Salvador.

Não vamos entrar no mérito de suas histórias, falar sobre os vários mitos, sobre a sua origem, mas sobre o significado da figura do rei para a consolidação de identidades negro-africanas fragmentadas através da escravidão.

Em algumas cantigas, Xangô é reverenciado como rei do mercado, Obá loja e rei do mundo, Obá aiyê. Mercado, coração das sociedades iorubás, onde se alternavam o tempo todo bens materiais com simbólicos.

Verdade é que no Brasil, essa figura foi fundamental no processo de reconstrução e manutenção dos elementos civilizatórios negro-africanos no Novo Mundo. Não poderia ser diferente, manifestação do Divino, a figura do rei representa continuidade, a permanência da grande família africana inclusiva, que com o passar do tempo foi ampliada a fim de agregar novos membros, agora descendentes de portugueses, índios, judeus, ciganos e tantos outros.

O culto a Xangô é assim o culto à continuidade, à descendência, à família mantida viva graças às mulheres e as crianças. Daí a sua relação com os antepassados e o por que de Xangô ser o ancestral mais festejado na sociedade secreta de Egungum ou nos rituais fúnebres, ocasião em que os iniciados levam no pescoço uma conta em sua homenagem.

Ao contrário do que se diz, o culto a Xangô possui relações estreitas com a morte, com o culto aos antepassados, pois ele mesmo representa toda a sua descendência.

Mas de onde surgiu a ideia de que “Xangô tem medo da morte”? Talvez da má compreensão da simbologia do rei, associada a outras leituras.

Explicando: ao contrário do que muitas pessoas afirmam, o elemento de Xangô é a terra. Seu culto rememora as civilizações que desde cedo foram estabelecidas pelos africanos.

Xangô é dono de tudo que existe em cima da terra. Graças a essa relação, desde cedo esse ancestral foi evocado como pedra e tudo que estas significam numa edificação. Desta maneira este princípio ancestral está presente nos corpos celestes.

Essa relação entre as pedras e o corpo é muito antiga e pode ser encontrada em algumas regiões do Mediterrâneo e partes do Continente Africano.

Fogo, assim, e tudo que ele representou para a humanidade, era então obtido através da fricção destes dois corpos. Porém, anterior a esse momento, é bem provável que a humanidade já utilizasse as pedras para reter o calor, aproveitando para conservar os alimentos.

Já demonstramos em outro momento que a temperatura é algo fundamental para os seres vivos. Quando o corpo perde o seu calor, princípio de vitalidade, acredita-se que ele está morto.

Não podemos confundir esse momento com os Antepassados. Estes, como Xangô são muito quente, pois estão vivos, continuam sob as tiras de pano que separam de nossos olhos o mistério da vida e da morte.

Assim, quando evocamos o Rei nos rituais fúnebres, estamos afirmando que acreditamos na nossa ancestralidade e que ela é a garantia de nossa permanência para sempre no mundo.

Quanto ao corpo, devolvemos à terra, pois como já comentamos, dessa devolução depende a continuidade da vida dos que virão. Afinal, tudo não é cíclico? Tudo não é uma manifestação do Sagrado?

A partir dessa explicação podemos pensar várias coisas. É certo que africanos e africanas tinham em mente a concepção de que as pedras deveriam estar juntas para poder produzir calor a fim de manter-se vivas. E assim fizeram.

Assim uma das características do culto ao rei preservada no Brasil foi a presença de muitas pessoas. O culto a Xangô requer muitas pessoas. Como se diz. Xangô adora gente. E o que é o mercado? Nada mais do que indivíduos que rompem suas fronteiras, quebram tabus. O rei também adora festas, comidas, bebidas.

Não foi a toa que quando os africanos organizaram os primeiros afoxés, o rei ia à frente, que digam os maracatus de Pernambuco.

E falando em Maracatu, como não falar da Kalunga, a boneca que diviniza nossos antepassados?

Falando sobre esse ancestral, no Brasil não podemos deixar de mencionar o nome de Tio Bangboxé. Ele teria chegado ao Brasil para ajudar na constituição de alguns terreiros de Candomblé que se formavam na cidade de Salvador no século XIX, onde o culto a Xangô era elemento central.

Fiel à sua missão, Bangboxé Obitikó constituiu no Brasil longa descendência através da família consanguínea que formou e da religiosa que desde cedo constituiu através de suas viagens a Porto Alegre, Rio de Janeiro e Recife.

Ainda hoje membros da família Bangboxe vêm da Nigéria visitar seus descendentes brasileiros.

O Babalorixá Air José lembra com saudade quando há dezesseis anos, sua tia consanguínea e bisneta de Tio Bangboxe passava horas conversando com seus parentes na sua casa, situada à Rua Xisto Bahia.

Da família consanguínea, destacamos a figura de Tia Júlia. Era filha do Tio Bangboxé; e da religiosa, Eugênia Anna dos Santos, a inesquecível Mãe Aninha que cem anos atrás fundou o Ilê Axe Opo Afonjá.

No terreiro fundado por Tia Júlia no Matatu, está à frente ainda hoje Irenea Sowzer, filha de Xangô e última bisneta do Tio Bangboxé. E no Terreiro da Rua Xisto Bahia fundado por Yá Caetana, está Yá Haydee Paim, também de Xangô.

Xangô que é rei, que gosta de coisa bonita e é muito vaidoso. Não no sentido pejorativo que utilizamos a palavra. Vaidade no sentido da autoestima.

O culto a Xangô nos faz olhar para dentro de nós mesmos, nos faz perceber que quando permanecemos unidos como pedras que formam o alicerce de uma construção, somos fortes. Ele ainda nos impulsiona a lutar contra todos aqueles que não se alegram com a nossa alegria. Viva o Rei!!!!

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*Vilson Caetano de Sousa Junior – Antropólogo, doutor em Ciências Sociais pela PUC de São Paulo, pós-doutoramento em Antropologia pela Unesp

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

9° Festiva Gastronômico de Pernambuco "A cozinha de terreiro na alta gastronomia"








9° Festiva Gastronômico de PE

Aff maria de coração nas mãos primeiro foi a etapa didática, apresentamos power point com o tema " CANDOMBLÉ UM RITO SUSTENTÁVEL", mostramos que o candomblé já praticava o que chamamos de sustentabilidade há mais de séculos, e o queanto é importante a preservação de culturas perdidiças.

já a segunda etapa teríamos um volshers de 200,00 para comprar insumos para elaboração de um prato a partir da proteína "peixe", fomos as compras eu e meu lindo parceiro Felipe e gastamos 151,00 pra fazer prato para 6 pessoas, Com uma plateia de 70 pessoas cozinhamos sob toque de tambores levado pela torcida do IlÊ AXÉ OGBON OBÁ de pai Everaldo de Xangô, fizemos o prato AXÉ OGUNDÁ "filé de surubim sob cama de latapá e acaçá recheado com queijo coalho e banana da terra.

... E adivinha: a receita campeã foi a receita que fiz com Felipe José " AXÉ OGUNDÁ"

nem acreditei, aff maria nunca sentí uma emoção dessas, quero de novo... tudo de novo...







Conseguimos mostrar que uma cultura que é tão rica quando o candomblé e tão antiga pode ser desconhecida por tanta gente, e por isso que algumas pessoas possam ter um certo receio, mas quem é que no Brasil não tem um sangue afro e foi nisso que apostamos num resgate de culturas perdidíças e conseguimos. Agradeço a Carmen essa mulher tão rica de cultura que me abriu os alhos para uma religião/cultura que nossos antepassados cultuavam e que muitos de nós não a conheçemos...
Felipe José


E agora só nos resta colher os frutos dessa grande conquista, agradeço a meus amigos que de alguma forma me ajudaram e incentivaram, a minha família, a meu irmão Everaldo, a meu marido por ter segurado a barra em casa enquanto estava pensando nesse projeto, a meu lindo forever FELIPE que pra mim não teria conseguido sem ele pois comida de orixá é energia de dentro pra fora e pra ter ficado maravilhoso o prato foi porque ele também deu muito de sua energia nele, e prncipalmente aos meus orixás, meu santo, meu amor, minha vida Xangô sem meu pai nada valeria a pena, pois a sustentação e a vontade de fazer com que os sonhos se realizem tem que partir de algo e sempre busco inspiração nos meus guias.
obrigado ao mundo por ter conspirado em favor do meu sonho!!!

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Comida de Santo


Explorando o assunto Comida de Santo, pode-se encontrar na literatura alguns textos. Fazendo-se agora um resumo e algumas colocações. Nina Rodrigues, em seus estudos, ao abordar à arte da culinária africana, achou difícil precisar, devido ao estado atual dos costumes, à quais grupos pertenceriam determinadas comidas. Já Manuel Querino assinalava que a contribuição dos grupos bantos, angolanos e jejes eram maiores que as dos nagôs, contrariando a tese dos que insistiam na sua predominância.

Nos terreiros, esta cozinha, marcada por uma série de preceitos e interdições, vai aparecer relacionada diretamente aos deuses através das chamadas comidas do santo. Assim, cada um deles irá receber em dias especiais (ou não) pratos de sua preferência. Não se trata, porém só de comer e sim o que se come, o que não se come, quando se come, com quem, participam de um todo integrado que diz respeito a códigos imprescindíveis dentro da culinária dos deuses. E mais ainda, esta comida dentro da dinâmica dos terreiros é um dos veículos de vital importância para a transmissão e distribuição de axé.
Seja essa comida reelaborada a partir de técnicas e maneiras predominantemente banto, jeje ou yorubá, esse negros modificaram as refeições do reino como já exposto. Outro fato que deve ser considerado é a falta de mantimentos num país desde o começo assolado pela fome. Da nova terra, o português ao lado das caças e muitos frutos, só pôde aproveitar a mandioca e o milho que eram alimentos básicos para o sustento e o qual era oferecido aos negros. Adotar os mantimentos da terra, ao lado de importar tantos outros como, por exemplo, o gengibre, arroz, inhame, banana, coco, dendê, foi à solução encontrada pelos portugueses para suprir a falta de alimentos. Cascudo (1970) diz que ao fim do séc XVIII os produtos americanos já estavam tão difundidos na África portuguesa que participavam das refeições nos negros, escravos ou livres.
Os ingredientes africanos vindos da áfrica, como o quiabo, o inhame, erva-doce, gengibre, gergelim, amendoim, melancia, dendê e outros foram entrando aos poucos no Brasil de acordo com as exigências do tráfico ou da população aqui estabelecida. Não é possível, no entanto, se pensar nesta cozinha e nem em uma outra somente a partir de tais elementos. Ela é mais do que um conjunto de matérias naturais que podem ser adaptados e substituídos. Esse próprio fato obedece a uma certa ordem inscrita nos mais remotos tempos, fazendo com que a comida não perca seu sentido nem se afaste da visão do mundo que ela representa. O que dá identidade à determinada comida não é a origem dos vários ingredientes combinados, mas a maneira como estes elementos são combinados. E estas maneiras obedecem a determinados ritos que lhe dão sentido e, como tais, apresentam-se como algo criativo. Assim, é completamente arbitrário buscar precisar datas para essa culinária, entendendo esta como algo parado, fechado, se o próprio tempo se incumbiu de dinamizá-la.
As condições de possibilidade para se pensar uma cozinha africana não podem ser pensadas em nível cronológico, assim como não podem prescindir desse tempo. Elas vão acontecendo, se dando, de acordo com o tipo de situação servil ou livre e o lugar em que vivia o africano, variando, desde o primeiro momento em que dividiu a cozinha com as africanas cozinheiras, até quando pôde, ante as novas condições suscitadas pelo processo histórico, negociar um tabuleiro.
O processo de criação das comidas africanas também se deve a importância dos jejuns e das festas regulados pelas igrejas ( outra questão complexa que não cabe abrir aqui). Os africanos tiveram também que adaptar às vezes sua alimentação, a hora e quantidade que se podia comer impostas pela igreja. Todavia, quando puderam providenciar seus próprios alimentos. é muito provável que tenham lançado mão do conhecimento acumulado e das várias experiências trazidas de suas terras, já somadas a tantas outras.
Tudo isso que foi colocado pelos autores não se trata de um retorno à África, mas fazer com que comida se faça africana, ou seja, remonte a histórias e passagens, visões de mundo associadas aos ancestrais, princípios universais ou antepassados, aos primórdios dos tempos quando estes fundaram a humanidade, constituíram as cidades e criaram os diferentes grupos. Visões de mundo juntadas a inúmeras outras experiências históricas constituídas no Novo Mundo. É este fazer que faz com que tal comida seja comida de santo.
A comida de santo diferencia-se, assim, daquela do dia a dia. Uma coisa é cozinhar um inhame e dividi-lo em pedaços e come-lo no café da manhã. Outra é preparar esse mesmo inhame para Oxalá, quando variam desde o tamanho, a forma das raízes, os procedimentos observados para sua feitura e por fim, as palavras ditas para encantar a comida. Fazer um feijão no azeite não é o mesmo que preparar um Omolocum. Neste nada pode se escapar, se escolhe bem os grãos, pois Oxun liga-se à fecundidade. Os deuses comem comida mais elaborada. Embora os ingredientes sejam os mesmos, mudam o tratamento que estes recebem. E a forma como estes são tratados expressa seu sentido através de um ritual onde nada é por acaso. Assim, Exu pode comer de tudo com já dizia um de seus mitos. Ogun pode receber feijoada, uma vez que as carnes gordas lhe pertencem. E Oxossi por se ligar a terra, recebe todos os frutos dados pelo Novo Mundo.

FONTE: Faces da Tradição Afro-Brasileira – CNPq
Santo Também Come - Raul Lody

domingo, 28 de março de 2010

Lembranças de Infancia





Lembro-me bem que em casa minha mãe possuía uma imagem de Iemanjá, enorme. Eu era apenas uma menina. nasceu dentro de mim, um carinho diferente por aquela senhora, de braços abertos, sorriso estampado, um manto em tom azul, com conchas caindo por seus braços, como diz hoje minha filha “glamurosa”, parecendo levitar sob águas em constante movimento. Sentia que era ela quem cuidava de mim como uma boa mãe que sempre foi, daí o meu amor incondicional a esse orixá.

Lembro-me que ao chegar à fase adulta e estarmos em melhores condições nos mudamos para um bairro onde tem uma Iemanjá na areia da praia, só que em dimensões ainda maiores, e é essa senhora que hoje minha filha adora gritar seu nome quando o carro pela ponte que fica próximo a ela passa; hoje eu, minha mãe que por sinal é filha de Iemanjá e minha filha sempre que pudemos vamos aos pés de Iemanjá e sob o som do mar, silenciosos, fazemos nossos pedidos, acendemos velas, agradecemos. A sensação de alívio e de proteção que é incrivelmente pessoal e intransferível.

Recordo-me também da delícia que era dona Lô, aquela senhorinha amável que adorava doces, muito simpática, com um ramo de “ervas mágicas”, rezando-as bem baixinho por todo o meu corpo, pedindo aos santos que mandem suas energias para me proteger, ou até mesmo das lindas festas de São Cosme e Damião do terreiro dessa mesma senhorinha, onde adultos inclusive seu filho, incorporados com os Erês brincavam conosco como se fossem verdadeiramente crianças. lembro-me bem de um homem menino arteiro, saltitante e levado chamado Lírio.

Hoje, após tantos anos, recordo-me do cheiro do mel, do dendê no fogo, das lindas festas, das comidas deliciosas, que na época era a ekédji Maria dos Prazeres que fazia, haaaaaaa como admirava aquela baixinha que se foi para junto dos nossos ancestrais, guardo-a comigo no coração porque tenho certeza de que fui muito amada por aquela mulher sábia, que mesmo na mais alta humildade de condições me ensinou muto do que hoje sei sobre cozinha de terreiro, ela foi a primeira a falar qual era de fato o meu orixá, sinto na boca o gosto que é se lambuzar com os bolos e doces das festas dos caboclos, das reuniões de de iniciação em jurema, onde o pai de santo sempre perguntava "quem pode mais do que Deus? e nós sob a aurea e o forte cheiro de alfazema respondíamos, ninguém". hoje estou caminhando para me tornar uma mãe pequena de uma casa de “culto dos deuses africanos”, na nação nagô, meu encontro se dá nos segredos das cozinhas dos orixás.

É na batida do tambor, no ijexá toque cadenciado pra oxum, na água da quartinha, no banho de folhas e ervas, no assentamento de meu pai Xangô, na riqueza de seu padê, no omolocum de Oxum e acarajé de Iansã, nos mitos dos orixás, que encontro minha esencia do meu self.

Explico-me. Self é a compreensão de que os orixás, energias-arquétipo se manifestam na natureza e na vida humana, não como se estivessem fora do indivíduo, mas dentro dele, em contato constante. Ou seja, o orixá está em cada um de nós, de modo indissociável, “do nascimento à morte, da fome a fartura, da alegria à raiva, do amor à dor. Daí a necessidade de nos “apossarmos” desses deuses e deusas como o próprio self, símbolos representantes das forças básicas da vida, de nossa vida.

O projeto do Restaurante teve inicio a partir de um sonho que eu tive logo após de dar uma oferenda aos orixás onde nesse dia eu ofertara uma cesta de presentes para oxum, digo que ao dormir sonhei cozinhando pra um monte de pessoas comuns, num ambiente que não era uma casa de santo, mas sim de um restaurante onde era servido o “Banquete dos Orixás”. Ao acordar não conseguia parar de pensar nesse sonho, o que fez com que eu viesse a comentar com um amigo e meu Babalorixá, ao ouvir o meu relato este perguntou se eu havia feito algum pedido em relação a minha vida profissional na cerimônia da entrega dos presentes a oxum, e eu respondi que sim, porque acabara de me formar em designer de interiores, mas não sabia ao certo se tinha feito a escolha certa, então tinha pedido para oxum me abençoar e ajudar a clarear minhas idéias para que ela apontasse um caminho pra eu seguir.

O babalorixá me confidenciou que são muito comuns os sonhos logo após uma oferenda bem aceita pelos orixás e que talvez este tivesse sido um recado dos orixás pra mim, escolher que caminho seguir...

É bem verdade o meu dom natural de cozinhar bem, e que por isso fui escolhida pelo orixá da casa para coordenar a cozinha dessa mesma casa de santo, mas nunca achei que poderia um dia viver disso, pois sempre cozinhei pra amigos como forma de exercício de generosidade, pois acredito que o maior tempero de uma comida é o amor, amor este que costumo botar em tudo o que faço.

Outro ponto também é que talvez esse projeto tivesse incutido na minha cabeça, mas eu nunca pensara dessa forma ao ponto de torná-lo um projeto de vida, eu sempre me fiz perguntas tipo: como seria a reação das pessoas se elas pudessem ter o acesso a estas comidas? Ou melhor, o que pensariam algumas pessoas quando comessem algumas comidas sabendo da sua origem? Sabendo que essas mesmas comidas são usadas nas oferendas dos orixás.

E a origem do nome “pedrinha de aruanda”, foi depois de uma nova conversa com uma entidade que pra mim é muito especial João Felipe de Aguiar, Um mestre da linha de jurema que eu costumo conversar sempre, pois pra mim ele é muito mais que uma
Entidade, pra mim ele é um ser de luz, um anjo da guarda que sempre recorro em todos os momentos da minha vida, pois sem eu falar o sonho que tive, ele falou minha querida Carmen você deve encontrar sua felicidade dentro de você e procurar le ouvir melhor, seguir mais sua intuição, “vejo você em algo com simplicidade e ares de palácios”, o que você tem a fazer é tentar algo que todo mundo goste, mas que você consiga fazer sua diferença.

Então imediatamente confidenciei o meu sonho e meu desejo e temor que envolvia todo esse projeto; temia perder o pouco de dinheiro que possuía, temia o preconceito das pessoas, com um desejo que poderia chegar aos extremos a glória ou a ruína, então ele me falou uma coisa que me fez ir as lágrimas “filha corra atrás do seu sonho, não fique esperando as coisas surgirem como facho de luz, eu posso energizar você, deixar você aberta pra que você receba tudo de bom que a vida pode te oferecer, abrir teus caminhos, mas nunca as coisas cairão do céu, Deus deu livre e arbítrio as pessoas e eu posso te aconselhar mas não posso mudar o que Deus escreveu pra você”.

Ao ouvir aquilo que tanto me emocionara eu cair em mim e decidi que não só iria abrir o Restaurante, como também iria me especializar naquilo, pois era fato que eu sabia de cor e salteado tudo o que acontecia nas cozinhas das casas de santo , eu mesma já tinha preparado por diversas vezes as oferendas dos orixás, então decidi fazer graduação em gastronomia mas não seria um curso estudado em qualquer instituição, teria que ser numa instituição conceituada e respeitada por todos, decidi fazer no SENAC, para além de conhecer toda a culinária mundial, eu aprenderia técnicas de gestão de pessoas, manipulação e técnicas de armazenagem de alimentos, eu mesma criar meus pratos e me especializar na comida que hoje chamam de afros brasileiras.

E o nome Pedrinha de Aruanda surgiu na toada que esse mesmo mestre canta toda vez que vai embora... E ao ouvir aquela toada tantas vezes já cantada por mim veio aquela sensação de que era aquilo mesmo que queria, ao ouvir trechos dessa canção; “pedrinha miudinha de aruanda êêêê, lajedo tão grande pedrinha de aruanda êêê”.

É bem verdade que a linha do povo de aruanda engloba outros seguimentos das casas de santos, mas também tem os orixás que serão o ponto focal desse projeto cultural, pedrinha que é algo pequenino, um pedacinho e aruanda que significa o Édem pra nós, o céu pros católicos então o nome pedrinha de aruanda significa “pedacinho do céu”.
E é esse projeto misto de magia, culinária e decoração onde eu contarei através dos pratos servidos na casa toda a história dos orixás partindo do quadrado amoroso vivido pelos orixás Xangô, Obá, Iansã e Oxum, contando de uma maneira linda toda a magia e encantamento da culinária que envolvia os protagonistas dessa história a começar pelo dia em que Obá cortou sua própria orelha para servir num prato de caruru a Xangô acreditando na deusa Oxum que dizia que ele adorava os seus pratos por causa da orelha... Onde servirei o famoso banquete dos orixás um pouco de tudo que é servido aos orixás nas oferendas, com toques genuinamente brasileiros para que todos possam saber a origem e mergulhar nesse mar não só das histórias dos orixás e da áfrica como também as historias do início da cultura negra no Brasil e no mundo.